‘A riqueza dos Kirchner vem de negócios ilícitos’, diz deputada argentina
BUENOS AIRES — Por trás do pesadelo judicial que está vivendo a ex-presidente Cristina Kirchner está outra mulher, que foi candidata à Presidência em 2015 e hoje ocupa uma cadeira na Câmara dos Deputados. Aos 61 anos, Margarita Stolbizer, líder da Frente Ampla Progressista, tornou-se peça-chave nos processos contra a ex-chefe de Estado. A deputada foi quem apresentou as denúncias que permitiram a abertura dos casos Los Sauces e Hotesur, nos quais Cristina é investigada por supostos enriquecimento ilícito, associação ilícita, lavagem de dinheiro e falsificação de documentos públicos. “Quando (o ex-presidente Néstor) Kirchner morreu (em 2010), Cristina poderia ter optado por ser a viúva que herdava sua riqueza. Mas não, ela quis dar continuidade e até mesmo ampliar os negócios ilícitos da família”, assegurou Margarita, em entrevista ao GLOBO. Para ela, mais do que presa, Cristina deveria ser inabilitada para exercer cargos públicos.
A senhora acredita que a ex-presidente poderia ser processada ou mesmo presa?
Vamos por partes. Primeiro, sim, a Justiça finalmente está avançando na direção correta e sempre achei que isso aconteceria, porque os crimes existiram. Temos elementos suficientes para provar isso. Agora, por outro lado, existe muita ansiedade, muitas pessoas querem ver Cristina presa. Mas penso que nem sempre a prisão resolve os problemas, considero muito mais importante uma eventual inabilitação para exercer cargos públicos, algo previsto no Código Penal. Isso deveria ser aplicado no caso de um funcionário eleito pelo voto popular que, posteriormente, traiu esse voto.
Esta semana foram realizadas várias inspeções em propriedades de Cristina. A senhora acredita que foram encontrados documentos que provam as acusações?
Muitas dessas provas já existem e já foram encontradas. Quando apresentamos nossa última denúncia, no caso Los Sauces, foi demonstrado um circuito muito claro no qual os empresários mencionados são beneficiados por decisões do governo (em concessões de obras públicas), e esses mesmos empresários terminam devolvendo, através do aluguel de imóveis, dinheiro às mais altas autoridades do país. Pagaram valores milionários. Nós encontramos uma parte, agora os juízes estão buscando mais elementos. Nós provamos os aluguéis de alguns imóveis, mas hoje vemos que existem muitos mais. De acordo nossos cálculos, num período de quatro anos a família Kirchner recebeu 20 milhões de pesos (em torno de US$ 1,3 milhão) em aluguéis, mas supõe-se que o montante foi muito superior.
Na quinta-feira, a Câmara Federal disse aos juízes que as investigações sobre Cristina Kirchner devem ser aprofundadas…
Foi uma resolução muito importante. A Câmara considera que os três processos mais complicados para Cristina não devem ser unificados, porque separados permitem que cada juiz possa trabalhar melhor, mas, ao mesmo tempo, em permanente consulta com os outros magistrados. Há muitas denúncias e são casos complexos, envolvendo faturas falsas, sobrepreços em obras públicas e benefícios a empresários amigos dos Kirchner por bancos públicos. A Câmara pediu cooperação entre os juízes e é isso o que fazem, porque todos os documentos encontrados são úteis a todos os processos.
O juiz Sebastián Casanello (encarregado de investigar a rota do dinheiro k) foi acusado de ter tentado proteger Cristina…
Agora o processo está bem encaminhado, e Casanello deverá, em algum momento, chegar aos máximos responsáveis. Porque Lázaro Báez (empresário kirchnerista, preso em abril), não poderia ter se enriquecido se funcionários dos governos Kirchner não o tivessem favorecido em concessões de obras públicas. Vemos que não são fatos isolados, existe uma organização.
O chefe desta associação foi Kirchner e, após sua morte, Cristina?
Sem dúvida. Ambos sempre tiveram uma concepção centralista do poder. Eles decidiam tudo. Quando Kirchner morreu, Cristina poderia ter optado por ser a viúva que herdava a riqueza. Mas não, ela quis dar continuidade e até ampliar os negócios ilícitos da família.
Os casos iniciados por suas denúncias se transformaram em verdadeiro pesadelo para os Kirchner…
Porque são casos que provam que o enriquecimento da família se deveu a negócios ilícitos.
A senhora imaginou este cenário?
Sempre soube que estava apontando a algo importante e que lhes doeria muito. Quando fiz a primeira denúncia, eles reagiram com outra acusação ridícula contra mim. Foi a prova de que eu estava no caminho certo.
Muitos kirchneristas se dizem envergonhados e alguns abandonaram as bancadas kirchneristas na Câmara e no Senado…
O problema foi que a corrupção se tornou pública e já não era possível defender isso. Muitos falam no final do kirchnerismo, mas para mim ele terminou quando perdeu a eleição. A fuga de kirchneristas não é pela corrupção, porque todos conviveram com a corrupção por quase 13 anos, mas porque perderam o poder.
A senhora pretende apresentar outras denúncias?
Continuarão surgindo elementos, e iremos ampliando as denúncias. Como mulher, sempre pensei que era bom ter uma presidente, mas foi uma fraude, prometeram coisas que nunca cumpriram e usaram o poder para enriquecer.