Prepare o bolso: preço da comida deve continuar superando a Inflação, alerta FGV
Brasil – Os brasileiros podem se preparar para um cenário persistente de aperto no orçamento doméstico. Segundo um estudo recente da Fundação Getulio Vargas (FGV), os preços dos alimentos devem continuar subindo acima da inflação geral por um período prolongado, pressionando ainda mais o bolso da população. A análise, publicada na Carta do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e assinada pelo economista Luiz Guilherme Schymura, aponta que a combinação de fatores como mudanças climáticas, foco em exportações e desvalorização do real está por trás dessa tendência preocupante.
De acordo com o levantamento, a produção agrícola no Brasil não tem conseguido acompanhar o ritmo da demanda interna, resultado de uma série de desafios estruturais. Desde meados dos anos 2000, os efeitos das mudanças climáticas têm se intensificado, com secas e chuvas extremas afetando diretamente as safras. Regiões mais quentes, como o Brasil, sofrem impactos ainda mais severos, o que compromete culturas essenciais como hortaliças e verduras – itens que, entre 2012 e 2024, acumularam alta superior ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial medida pelo IBGE.
Outro fator destacado pela FGV é a priorização de culturas voltadas à exportação, como soja e milho, em detrimento da produção de alimentos para o mercado interno. A desvalorização do real torna os produtos brasileiros mais competitivos no exterior, incentivando os produtores a direcionarem suas colheitas para o mercado internacional. Isso, porém, reduz a oferta doméstica e eleva os preços localmente. “Com o real desvalorizado, vender em dólar é mais lucrativo, mas isso encarece os insumos importados, como fertilizantes, e pressiona toda a cadeia alimentar”, explica Schymura.
A análise também aponta que políticas internas, como o aumento real do salário mínimo e a expansão do Bolsa Família, elevaram a renda de parte da população, o que ampliou a demanda por alimentos. No entanto, sem um crescimento correspondente na oferta, o resultado é uma pressão inflacionária contínua. Para itens como carne, o chamado “ciclo do boi” – que reduz a oferta a cada cinco anos – e a crescente demanda externa, especialmente desde 2017, agravam o quadro.
Hortaliças e verduras, por sua vez, enfrentam desafios adicionais. Além da vulnerabilidade a condições climáticas adversas, a redução dos chamados “cinturões verdes” em áreas urbanas e o aumento do custo da mão de obra dificultam a produção. “Há também uma mudança de hábitos, com mais pessoas buscando uma alimentação saudável, o que eleva a demanda por esses produtos”, observa o estudo.
Diante desse cenário, a FGV sugere que a solução passa por um estímulo à produção de alimentos voltados ao consumo interno, sem prejuízo às exportações. “Não se trata de restringir a soja, que traz divisas e estabiliza a economia, mas de incentivar uma oferta adicional de alimentos para a mesa do brasileiro”, defende Schymura. Ele destaca que investimentos em infraestrutura agrícola e políticas de longo prazo são essenciais, embora os resultados possam demorar a aparecer.
Enquanto isso, o governo enfrenta o desafio de conter a insatisfação popular. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já sinalizou preocupação com a alta dos alimentos, chegando a mencionar a possibilidade de “medidas drásticas”. Contudo, a FGV alerta que não há solução imediata à vista. Para os consumidores, resta ajustar o orçamento e torcer por uma trégua que, ao menos por enquanto, parece distante. O recado é claro: prepare o bolso, porque a comida deve continuar pesando mais do que o esperado.
Créditos: Infomoney