Figurões republicanos resistem a apoiar Trump
WASHINGTON – Ao contrário do esperado, a resistência ao nome de Donald Trump como candidato republicano para as eleições presidenciais de novembro parece crescer a cada dia em seu partido. Ontem o presidente da Câmara dos Deputados, Paul Ryan, afirmou que “não está pronto” para apoiá-lo agora, enquanto os dois últimos presidentes americanos pela legenda, George W. Bush e George H. W. Bush, informaram, em nota, que “não participarão da campanha presidencial”. Por sua vez, a imprensa americana iniciou uma reflexão autocrítica pelo crescimento e pela campanha vitoriosa do bilionário, que anteontem se tornou o virtual candidato do partido de oposição a Barack Obama após a desistência dos demais postulantes.
Ryan é considerado um dos republicanos mais proeminentes para o futuro. Ocupando o mais importante cargo entre os integrantes da legenda, ele era visto por sua cúpula, inclusive, como o “nome dos sonhos” para ser candidato a presidente, caso a convenção republicana fosse contestada, ou seja, não houvesse um vencedor claro no processo de primárias.
— Eu apenas não estou pronto para fazer isso neste momento (apoiar Trump). Eu não posso fazer isso agora — disse Ryan, deputado pelo Wisconsin, em entrevista à CNN, na qual afirmou esperar que Trump tente unificar o partido. — Mas o movimento tem de partir dele.
Em sua página na internet, Trump respondeu: “Eu não estou pronto para apoiar a agenda de Ryan. Talvez no futuro possamos trabalhar juntos e chegar a um acordo sobre o que é melhor para o povo”.
A rejeição fez vários analistas questionarem o papel da imprensa na ascensão do bilionário. No começo da campanha, ele era tratado de forma caricata, e todas as suas propostas polêmicas eram repetidas, principalmente nos canais de televisão, sem críticas mais contundentes de integrantes do partido. Alguns chegam a afirmar que os jornalistas não foram a fundo nas propostas de Trump ou em seu passado, falhando na missão de informar o público, simplesmente por não acreditarem na viabilidade de sua candidatura.
Colunista diz que comerá jornal
Jim Rutenberg publicou ontem no “New York Times” que a cada ciclo eleitoral os erros dos meios de comunicação, como maus prognósticos, tratamentos diferenciados e falta de análises mais aprofundadas, ficam mais visíveis. “Mas nesta temporada a imprensa tem sido verdadeiramente espetacular em suas falhas”.
Ele critica a forma como a política americana tem sido coberta pela grande imprensa desde o surgimento do Tea Party, o movimento de extrema-direita. “Mas no final, você tem que apontar o dedo para o jornalismo político nacional, que muitas vezes tem perdido de vista suas diretrizes primárias nesta época de eleição: ajudar leitores e telespectadores a encontrarem sentido no caos presidencial; reduzir a confusão, não ampliá-la; resistir ao impulso de obter audiência, cliques e vendas de anúncios acima do imperativo de acertar”.
Apesar disso, ele conclama os jornalistas a cumprirem seus objetivos na corrida presidencial de fato, a “segunda chance” dos jornais neste ano. Outros veículos, como o “Vox”, contudo, acreditam que os erros de avaliação da cobertura jornalística, que teriam na opinião deles beneficiado Trump, tendem a continuar. “Haverá uma tendência para normalizar esta eleição, para torná-lo Coca-Cola contra a Pepsi em vez de Coca-Cola contra a água de esgoto”, escreveu David Roberts no site, afirmando que Trump não poderia ser tratado como um candidato viável e “normal”.
Outros jornalistas foram obrigados a assumir seus erros. O colunista político Dana Milbank, do “Washington Post”, tinha feito a promessa no início das primárias: se Trump se tornasse o candidato republicano, ele comeria o jornal. Agora disse estar disposto a cumprir o prometido.
“Para engolir isso (o jornal e mais seis meses do noticiário sobre Donald Trump), vou precisar de uma bebida forte”, brincou o colunista em seu recente artigo, quando afirmou que cumprirá sua promessa e refutando os “acompanhamentos” sugeridos por leitores à sua promessa, como pimenta mexicana, em alusão à proposta de Trump de construir um muro na fronteira entre os dois países.
Melinda Henneberger, editora-chefe do “Roll Call”, especializado na cobertura do Congresso, afirma que programas de auditório e canais populares de TV aproveitaram a imagem pública do bilionário para tentar alavancar suas audiências, algumas vezes de forma irresponsável, mas que outros veículos fizeram uma cobertura séria sobre sua candidatura.
— Os meios de comunicação não são todos iguais. Mas você nunca viu uma corrida eleitoral em que cada discurso que Trump deu era mostrado ao vivo, na íntegra, em canais de TV a cabo. Então, acredito que algumas críticas são justificadas — afirmou.