Patrimônio degradado em Vassouras e Petrópolis correm risco de desabamento
RIO – Um solar majestoso ocupou por mais de cem anos o número 15 da Praça Eufrásia Teixeira Leite, no Centro Histórico de Vassouras. Hoje, quem passa em frente à construção, antiga residência do Barão de Vassouras, só consegue ver ruínas por trás de tapumes. Sem telhado nem paredes internas, o edifício em estilo neoclássico faz parte do conjunto tombado desde 1958 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Não longe dali, o antigo Asilo Barão do Amparo também parece prestes a cair. Erguido entre 1848 e 1853 para ser o Hospital da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia, só não veio abaixo ainda porque está escorado. As duas edificações, parte de uma lista de oito imóveis que aguardam desde 2014 o início das obras do PAC Cidades Históricas, retratam o abandono dos casarões do Império, problema que se repete em Petrópolis, outra cidade histórica.
Quem visita Vassouras ainda se impressiona com o Centro Histórico. Mas, se a Igreja Matriz e o chafariz principal estão bem cuidados, o mesmo não acontece com o Chafariz Dom Pedro II, construído a pedido do monarca. As bicas de cobre desapareceram. A lista de imóveis que já atravessaram dois séculos — e perigam não durar nem mais uma década — é extensa: inclui também o Casarão da Associação de Paroquianos de Vassouras, a Casa de Cultura e pelo menos três casarões que correm riscos. Todos bens do século XIX.
No mês passado, a própria presidente do Iphan, Jurema Machado, esteve na cidade e, como noticiou Ancelmo Gois, voltou preocupada com a situação dos imóveis históricos. Em ofício ao prefeito Renan de Oliveira, ela reconheceu, porém, as sérias restrições orçamentárias do órgão.
A professora de História Sandra Candido, que integra o Conselho Municipal de Cultura, critica a falta de consciência dos donos de alguns imóveis tombados.
— Quando falamos de preservação, os donos de algumas casas acham que a responsabilidade de conservar o prédio é da prefeitura e deixam o imóvel cair. Falta consciência — diz Sandra, que cita como exemplo de bem privado degradado a Casa das 14 Janelas, que está sem telhado.
Vassouras foi selecionada pelo Iphan para o PAC Cidades Históricas. Em 2013, foi autorizado o desenvolvimento de projetos para oito bens na cidade, até o limite de R$ 26,8 milhões. Já foram desembolsados R$ 1,9 milhão, para os projetos executivos. E o Iphan, junto com a prefeitura de Vassouras, agora busca novas fontes de recursos.
SEM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO
Em Petrópolis, assim como em Vassouras, não existe um órgão municipal técnico de proteção ao patrimônio. Ali, a prefeitura limita-se a conceder descontos em IPTU aos proprietários de bens tombados em bom estado.
Para a presidente da Associação de Moradores e Amigos do Centro Histórico (AMA), Myriam Born, a situação do patrimônio em Petrópolis é dramática:
— A constante e proposital negligência da prefeitura e o insuficiente poder político e estrutural de órgãos de preservação estadual e federal estão levando este importante legado exemplar do século XIX — diz Myriam Born.
MORADORES LAMENTAM ABANDONO NA CIDADE IMPERIAL: IPHAN AGUARDA RECURSOS PARA OBRAS EM CASARÃO, POR DETERMINAÇÃO DO MP
Dois casos recentes ilustram o problema da degradação do patrimônio de Petrópolis. Em fevereiro, o Iphan determinou que o autor de novelas Aguinaldo Silva iniciasse a demolição de parte da pousada que está construindo na Avenida Ipiranga. A alegação é que o autor fez modificações e cimentou o jardim da frente, transformado-o em estacionamento, e que um novo prédio estava sendo construído anexo ao casarão tombado, desrespeitando o projeto aprovado. Em fevereiro, Aguinaldo Silva admitiu que foram feitas alterações no projeto, mas afirmou que não recebeu um documento com todas as medidas que deveria adotar. Procurado pelo GLOBO, o autor não respondeu.
Moradores de Petrópolis também lamentam o abandono de imóveis como a Casa Franklin Sampaio, na Praça da Liberdade. Com dívida de mais de R$ 72 mil só de IPTU, o imóvel está degradado. Construído em 1874, foi sede do governo do estado e há um século chegou às mãos dos Sampaio. Em 2000, os donos do imóvel e a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) fecharam contrato de comodato. Chegaram a ser investidos mais de R$ 860 mil numa restauração. Mas, em 2007, a Firjan pediu rescisão do contrato. O lugar foi abandonado pelos proprietários. O Iphan informou que aguarda a liberação de recursos para obras emergenciais, por determinação do Ministério Público estadual.
O arqueólogo e historiador Claudio Prado Mello lamenta a situação:
— No Brasil, por sua situação geográfica e seu clima úmido e, consequentemente, pela abundância de cupins, a preservação dos edifícios históricos não é fácil. E, dentro de um quadro em que os recursos públicos nem sempre têm o destino devido, a conservação se torna um problema.