Brasília Amapá Roraima Pará |
Manaus
STORIES
Brasília Amapá Roraima Pará

Servidora pública sofre ameaça velada de terceirizado após questionar negligências e atrasos no SPA do São Raimundo

Compartilhe

Manaus – Uma grave denúncia de desrespeito e omissão institucional abala o Serviço de Pronto Atendimento (SPA) do São Raimundo, em Manaus. Uma farmacêutica bioquímica, servidora pública com mais de 23 anos de profissão, da Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas (SES-AM), relatou ter sofrido intimidações por parte de um funcionário da empresa terceirizada LABSA, após questionar atrasos recorrentes e irregularidades no funcionamento do laboratório da unidade.

O caso aconteceu em uma quarta-feira, dia do plantão no qual a servidora era responsável. Na ocasião, foi realizada  uma reunião para alinhar procedimentos e esclarecer funções da equipe, diante das constantes ausências e atrasos de funcionários terceirizados no horário estipulado, que poderiam causar danos ao atendimento dos pacientes.

Ao chegar atrasado, o funcionário terceirizado reagiu de forma agressiva quando questionado sobre seu horário, respondendo de forma grosseira. Segundo a servidora, ele gritou, jogou papéis em sua direção e proferiu falas como: “Não te mete comigo que tu vai ver o que vai te acontecer!”. O episódio, presenciado por colegas, deixou-a abalada, chorando e temendo por sua segurança.

A farmacêutica conta que informou o ocorrido à gerente administrativa da unidade de Saúde, via ligação de celular, mas nenhuma providência imediata foi tomada pela direção do SPA. O funcionário continuou escalado nos mesmos plantões da farmacêutica, intensificando seu medo.

“Eu chegava ao trabalho em pânico, com crises de ansiedade, taquicardia e medo de ser agredida”, relatou. A servidora descobriu, por meio de um advogado amigo, preocupado com a sua integridade, que o funcionário respondia a dois processos criminais, o que agravou sua sensação de insegurança e medo. 

Após ver que nada estava sendo feito pela administração do SPA, a concursada solicitou transferência para a unidade do SPA Joventina Dias. No entanto, a situação se complicou ainda mais. Ela foi recusada pela gerente ,que alegou falta de vagas, mesmo com a unidade enfrentando carência de farmacêuticos bioquímicos. A decisão foi considerada incoerente pela servidora que questionou a negativa, pois após seu retorno ao SPA do São Raimundo, a direção do Joventina pediu apoio para a realização de exames por ausência de bioquímico na unidade.

Sem alternativa, ela permaneceu no SPA do São Raimundo, onde o clima hostil se intensificou, com a mesma passando a sofrer assédio moral, calúnias e difamações por parte de funcionárias terceirizadas  que tentavam a todo custo denegrir e fragilizar a sua imagem. O comportamento do grupo teria explicação devido a uma suposta proteção do funcionário por parte da coordenadora da empresa LABSA, que teria envolvimento amoroso com o terceirizado. O indivíduo se sentia tão impune que passou a desrespeitar não apenas colegas de trabalho, mas pacientes e acompanhantes da unidade. “Ele chegou desrespeitar de forma agressiva uma senhora que acompanhava o sogro de 84 anos, que estava sofrendo com princípio de infarto. Nada aconteceu com o terceirizado”. Esta paciente também chegou a prestar queixa na Ouvidoria da SES.

Com a impunidade para os terceirizados e seus simpatizantes, o clima de trabalho ficou insuportável não apenas para a servidora para também para os seus demais colegas concursados. Desde que a LABSA chegou, 22 funcionários exemplares foram desligados pela direção ou pediram transferência para outras unidades de Manaus.

“Eu já não tinha mais forças para ir trabalhar. Tinha pânico ao chegar à unidade pois elas – as funcionárias da LABSA – viviam inventando mentiras sobre nós para nos prejudicar”, relatou a servidora pública chorando.

O impacto na saúde mental da farmacêutica foi devastador. Diagnosticada com ansiedade generalizada e síndrome do pânico, ela precisou iniciar tratamento psiquiátrico e tomar medicamentos controlados. O estresse também comprometeu seu plano de ser mãe e de realizar uma fertilização in vitro, cancelada devido a alterações hormonais oriundas do abalo emocional ao que foi exposta.

”Eu amava meu trabalho, mas me vi obrigada a implorar para sair da unidade. Fui desrespeitada como profissional e como mulher”, desabafou.

Após insistência e uma grande peregrinação diária de três meses na sede da SES-AM, a funcionária pública finalmente conseguiu ser transferida, mas teve que abrir mão temporariamente de sua função como farmacêutica bioquímica, pela qual era concursada.

Ela critica a omissão da direção do SPA e da SES-AM, que, segundo ela, priorizam terceirizados em detrimento de servidores concursados e negligenciam o assédio moral sofrido pelos servidores: “Trabalhei incansavelmente durante a pandemia, sempre pontual e dedicada, fui a única bioquímica que não pegou COVID-19 e fui sobrecarregada, pois tirava os meus plantões e os dos colegas que estavam doentes”, desabafa. “A prioridade para mim sempre foi o paciente. Agilizava os exames para um diagnóstico mais rápido e preciso. Ver minha saúde destruída por um ambiente tóxico e hostil é desumano”, afirmou.

Felizmente, a farmacêutica e outras vítimas conseguiram apoio de órgãos como a ouvidoria da Mulher do TCE-AM e também da equipe do Núcleo de Apoio às Mulheres vítimas de violência, do TJAM.

Outras servidoras relataram emocionadas, em depoimento no TCE, o assédio que sofreram dos funcionários da LABSA onde passaram a adoecer. Em relatos emocionantes que duraram ao todo 10 horas elas tiveram o acolhimento da equipe da Ouvidoria da Mulher do TCE AM.

Relataram de forma uníssona que foram assediadas, caluniadas e nada foi feito pela direção da unidade onde expuseram a conivência da gerente administrativa que permitia que os terceirizados violassem as regras.

“Quem reclamasse era retirado da unidade, como retaliação, como uma forma de calar os outros”, disse uma das testemunhas. 

Atrasos, perseguições, assédio moral e até mesmo exames errados fizeram com que ao menos 8 servidoras solicitassem transferência da unidade, pois não tinham mais saúde mental para continuar.

“Eu me sentia em um campo de concentração nazista, onde qualquer respiro meu seria motivo para ser levada para a câmara de gás. A gerente administrativa disse que quem reclamasse seria devolvido”, relatou uma servidora que foi vítima de assédio por parte das funcionárias terceirizadas.

Mesmo após deixar o SPA do São Raimundo, a servidora conta que as perseguições e difamações continuaram e quem tentava a defender ela, passava e se tornar o novo “alvo”. “Uma funcionária da noite passou a caluniar a farmacêutica para os demais após ela sair. Uma servidora relatou que quando esta funcionária tentou denegrir a farmacêutica, ela se retirou do local dizendo que não compactuava com mentiras pois a farmacêutica sempre foi uma profissional altamente capacitada e ética“.

A denúncia, protocolada na Ouvidoria da Mulher e no Ministério Público expõe falhas na gestão de conflitos e na proteção de servidores públicos, sobretudo mulheres. O caso levanta questionamentos sobre a terceirização nos serviços de saúde e a falta de accountability em unidades do SUS. Até o momento, a SES-AM não se pronunciou oficialmente sobre as medidas tomadas em relação às acusações. Até hoje, a servidora continua lutando para recuperar sua saúde e dignidade.





Siga-nos no Google News Portal CM7



Carregar mais